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ENTULHO por Fellipe Fernandes - Um Texto Precisa de Imagens
É fato.Mas quando as imagens precisam de texto?Ontem, ao assistir à performance ENTULHO, com Guilherme Gorski sob direção de Ruy Filho, a sensação que tive foi que as cenas plásticas sobre consumismo, fetichismo e o constante sufocamento que decorre da combinação de ambos pediam, antes mesmo de serem encenadas, as palavras de Mme. Nicolielo, dramaturga da performance e minha amiga.Cada palavra desde o início do ato fala por si, sem precisar de muitos devaneios. A descrição dos objetos, a localização deles, o que representam na vida daquele personagem genérico que se atordoa no monte de roupas, livros e revistas espalhados pelo chão da arena do Centro Cultural Rio Verde, em Pinheiros, levam consigo a marca de quem as escreveu.Quando, entretanto, chega-se ao excerto lido pela voz de Débora Falabella atinge-se a um belo que, não bastasse ser sozinho em sua beleza, exige do espectador a entrega das paixões fulminantes que mais se prendem na saudade e no que poderia ter sido do que na busca quase infindável daquilo que poderá vir a ser.É quase a mesma culpa que se sente quando se gasta dinheiro sem necessidade. Ou melhor, o mesmo flagelo que é comprar e acumular sem, no entanto, preencher os vazios.Cada vez que compramos coisas das quais prescindimos, cada vez que, diante do afogamento diário em informações desnecessárias, em equipamentos que, sob a premissa de facilitar a vida, nos prende ainda mais a uma linha invisível e muito frágil chamada insegurança, falta-nos o sopro das importâncias.Cada um sabe da sua.Mme. Nicolielo, em pouco mais de um par de páginas gravadas, traduziu isso em poesia numa prosa objetiva, despretensiosa e, sem uma única vez sequer ter citado claramente em letras aquilo sobre o que o texto falava, muito coerente.Gostei da iluminação, da cenografia e da utilização dos espaços. Muitas vezes durante os 70 minutos do espetáculo você se vê esquivando de livros voadores, camisetas indiscretas, gritos ultrajantes, ouvindo muito de perto o ator ofegante, provando um pouco do soterramento pelos entulhos do que hoje temos por vida.Determinados momento, senti que eu queria me por no lugar dele e, na construção de sua pirâmide de lixo, símbolo de um poder do desespero, opressor em sua veleidade, pegar os livros que ele não pegou, ver as fotos que ele não viu, dobrar as roupas que estão espalhadas pelo chão e limpar o futuro antes que seja tarde demais.Só que estamos a um passo desse momento.O que me incomodou um pouco - nada tão prejudicial quanto foi a encenação para Senhora dos Afogados, peça sobre a qual falei aqui noutro dia - foi o Gorski já ter começado a performance num ponto sem volta. A mim teria me incomodado muito mais se ele, como qualquer pessoa, tivesse entrado em cena do ponto em que nós mesmos, enquanto espectadores, estamos, sem muito dar pelo que nos rodeia.Isto é, fazer crescer o movimento paradoxal da minimalização.Quem se interessar em assistir, preste atenção em algumas imagens como a final e em algumas metáforas em relação ao cotidiano insensato em que muitos de nós vivemos.No entanto, vá sabendo: se ver é muito importante nesta dramaturgia, ouvir é imprescindível.Literatura.
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